quinta-feira, 2 de abril de 2009

Carlos Careqa - Vulgarizando o Raro e Rareando o Vulgo



Nascido em Lauro Muller (SC), Carlos de Souza passou infância e juventude no Paraná, onde estudou música a teatro, antes de radicar-se em São Paulo. Foi o responsável por várias trilhas para peças de teatro e trabalhou como ator em peças e filmes de cinema. Sua atuação no mercado publicitário, desde 1986, também é relevante, já tendo feito mais de 80 peças comerciais. No início da década de 90 apresentou-se em bares e casas noturnas de Genebra e Berlim. Em seguida atuou no grupo Pêlo Público, em São Paulo. Radicado em São Paulo desde 1991. Lançou 4 CDS PELO PÚBLICO (Thanx God/Tratore) Lançado em 2006, com a participação do Cantor Falcão. Contem canções realizadas nos anos 90 com o grupo Pelo Público em São Paulo. Gravado ao vivo no Teatro do Sesc Ipiranga, com a participação posterior de Mario Manga. NÃO SOU FILHO DE NINGUÉM, (Thanx God/TRATORE), lançado em 2004 traz uma variedade de ritmos e propostas musicais. Produzido por Marcos Vaz, Mario Manga, Gabriel Levy, André Abujamra e pelo próprio Carlos Careqa, mistura timbres e provoca o ouvinte a uma reflexão da atualidade. Com participações de grandes nomes como Chico César, Zeca Baleiro, Vânia Abreu, Jards Macalé, André Abujamra e Edson Cordeiro. MÚSICA PARA FINAL DE SÉCULO, (Thanx God/TRATORE) disco lançado em 1999, que contém canções que foram gravadas por Rita RIbeiro, Vania Abreu, Selma Carvalho, Zé Guilherme, Adriana Maciel, entre outros. Foi indicado por David Byrne como um dos melhores discos do ano de 1999.


Porque compor música?

Eu faço canção. Sou um cancionista, como diz o Luiz Tatit. Gosto de fazer canção, pois é um jeito de expressar uma idéia, naqueles fatídicos 4 ou 5 minutos.

Sei que você já teve várias parcerias queria saber se você acha mais fácil ou mais difícil trabalhar com parceiros? O quanto a parceria interfere na sua idéia original?

Eu sempre trabalhei com parceiros. aprendi muito com eles. Dependendo do parceiro fica fácil trabalhar, e se fica difícil, eu já desisto logo, pois depois de alguns anos a gente vai aprendendo a escolher o que é melhor pra gente. Cada caso é um caso. As vezes o parceiro interfere na idéia original, as vezes não...

Qual foi a primeira vez que percebeu que a música fazia parte de você?

Eu era criança e ouvia rádio. Acho que naquela época eu só ouvia rádio, e Roberto Carlos estava presente o tempo todo. Então eu ficava brincando de imitar o RC. Depois fui cantar em programas de calouros em Curitiba, e assim percebi que a música fazia parte de minha vida, apesar de nunca ter pensado, nesta época em ser profissional.

Como foi a sua experiência ao tocar pela primeira vez nos Estados Unidos?

Eu fui para os USA, para batalhar a vida mesmo, pois aqui a coisa estava muito ruim. Nem pensei que eu ia trabalhar com música lá. Mas levei o violão e um repertório de MPB. Chegando lá fiz amigos e fui indicado para tocar num restaurante, nunca tinha tocado profissionalmente aqui no Brasil, isto aconteceu em Fevereiro de 1984.

Você se considera um cosmopolita? Ou qualquer tipo de “ista” ou “ita” te incomoda?

Não penso neste assunto. Eu sou um ser humano, e posso viver em qualquer lugar que eu queira, eu acho. O homem tem esta capacidade de se acostumar a tudo.

Quando e como foi o seu primeiro encontro com Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção? No que esse encontro influenciou o seu trabalho?

Eu escutei o Arrigo pela primeira vez em 1982, fiquei pirado. O som dele era muito inovador para aquele momento.
Depois conheci também o Itamar, fiquei muito feliz pois era isso que eu procurava fazer naquele momento. Um som inovador para a música brasileira.
Depois conheci o Arrigo pessoalmente em 1990, em Curitiba, quando abri um show dele. Ficamos amigos, e ele me ajudou a realizar o meu primeiro disco.

A experiência do seminário trouxe uma influência em suas composições? Parece-me que o seu trabalho tem particularidades dessa experiência?

Bem, foi no seminário que eu tive minhas primeiras aulas de música. Também pude exercitar lá o meu lado cantor, já que cantava nas missas e até dirigia os cantos litúrgicos. Aprendi a tocar violão no Seminário com 15 anos... Depois tive experiência com o conjunto que tocava músicas seculares, eu era o guitarra base...
Algumas canções tem alguma relação com esta época sim, mas não saberia dizer qual.

Há em algumas de suas canções uma vaga lembrança da música caipira, mas ao mesmo tempo ela tem fortes elementos urbanos. Você concorda com isso?

Sim, eu tenho um lado caipira, herdado do meu pai. Talvez minha mãe cantasse músicas caipiras, eu ouvia. Gosto muito de ouvir estas músicas nas vozes das duplas tradicionais da música caipira brasileira.

É difícil compor uma letra como Cidade do disco os homens são todos iguais? È curioso como a música começa com um canto religioso típico de uma cidade de interior e de repente entramos no mundo da cidade e da uniformidade? Acabei rimando com a letra da música...rssss....

Bem esta letra é do meu amigo Milton Karam, ele me deu esta letra em 1984 para que eu musicasse. Eu fiquei feliz, pois a letra tinha muito sentido, principalmente na Curitiba daquela época. A gente estava vendo a cidade se transformar. A idéia do canto religioso é do Chico Mello, gravamos na novena da igreja do perpétuo socorro em Curitiba. Foi uma experiência muito legal. Hoje quando escuto esta música fico muito feliz com o resultado. O arranjo do Chico lembra um pouco os Tropicalistas...


Em algumas de suas letras há o uso de frases com conotações populares como por exemplo “ muito limão e pouca pinga”, da música “tudo que respira quer comer”, ou em “me da uma colher de chá”, da música “meu querido santo Antonio”. Existe nisso a intenção de aliviar a tensão das letras ou o interesse em reconstruir o sentido dessas frases?

Eu gosto de usar o vulgar. Gosto da frase de Werneck, um poeta Curitibano: VULGARIZAR O RARO E RAREAR O VULGO...
então expressões do dia a dia bem usados numa canção podem servir pra expressar uma idéia.

Na música “Língua de Babel” me parece que você fala sobre o processo de criação e sobre o lugar o comum. Porque orar na língua de Babel?
Acho que fizemos a canção para "explicar" o processo de criação. Orar na língua de babel é uma utopia, falar em todas as línguas. Também é uma canção de amor, mas talvez não o amor romântico e sim o amor universal. Uma canção que agasalhe você e eu...

Em “Ser igual é legal”, do disco “musica para final do século” , há uma critica a necessidade da nossa sociedade da vitória e do sucesso gostaria que você comentasse um pouco sobre a música e sobre esse assunto?

Esta canção é exatamente sobre isso. Foi inspirada no Livro do Tao. Todos querem ser o primeiro, só que não existe muitos primeiros lugares. Por quê não podemos ser iguais, sem ser medíocres???
O caminho do meio é o mote desta e outras canções que escrevo. Acho ótima esta idéia, ainda que difícil de praticar.



Como funciona o seu processo de criação? A letra vem primeiro ou a música ou ambos?

Geralmente pinta uma idéia de letra, depois a música, as vezes as duas vem juntas. Estou tentando fazer música antes, para mim é mais difícil este processo.

Há um certo amadorismo no compositor hoje em dia?

Acho que há um modismo por assim dizer. Todos querem ser artistas e compositores. Porém nem todos tem algo a dizer, então fica um processo de desabafo simplesmente. Vejo cantoras que estão compondo, O.K., mas elas estão somente exercitando a Vaidade, e não querem dizer nada.

Você acredita em movimentos musicais ou os movimentos musicais são mais um reflexo do momento?

Acho que movimento é super importante, a gente está sempre em movimento. Os movimentos musicais existem sim, mas nunca de cima pra baixo. Ninguém se reúne numa sala e diz Vamos fazer a Bossa Nova!!! Estas coisas acontecem naturalmente, como aconteceu realmente com a Bossa Nova. São idéias que vão se aglutinando e formando um movimento global.


Uma vez vi uma entrevista do B.B. King em que ele dizia que no começo de sua carreira ele ia nos bares onde os arranjadores freqüentavam e pagava algumas bebidas e eles faziam os arranjos de suas músicas.Há muito tempo a indústria americana passou a valorizar a figura do arranjador.Como funciona os arranjos de sua música? È você mesmo quem faz ou transfere isso pra outros?

Eu sempre trabalhei com músicos ótimos. Então fazemos muitas coisas juntos. Eu dou idéias e eles aprimoram. Alguns arranjos são feitos isoladamente pelo arranjador, mas não gosto muito deste processo. Eu gosto de interferir. Quando tocamos juntos, os músicos colaboram com improvisos e isto soma-se ao arranjo.

È difícil viver de música autoral no Brasil. Eu sempre ouço que a música brasileira é a melhor do mundo. Mas me parece que há uma formação muito deficiente do ouvinte brasileiro e que ele não sabe diferenciar o joio do trigo. O que você acha? O que deveria ser feito?

Primeiro, deveria-se pagar os direitos autorais. Muitas emissoras não pagam direitos. Casas noturnas, bares, restaurantes também não pagam. Acaba recebendo grana quem investe em Jabá, para fazer tocar em rádios que estão em conluio com Editoras e Gravadoras...
Eu não estou na industria fonográfica. Mas ouço falar que a coisa funciona deste jeito.


São Paulo e Rio de Janeiro são a ilusão do compositor?

Acho que sim. Aqui em SP as coisas funcionam melhor do que em outros estados. Há uma vontade de Profissionalizar o meio. Mas as outras capitais estão se organizando também. Agora existe Sociedades de Direitos Autorais espalhadas por todo o Brasil, antes não existia, só havia no Rio e em São Paulo.

Quando eu era garoto e gravei pela primeira vez em 1988 eu gravei num estúdio uma demo tape que morreu comigo, pois não havia recursos para divulgar o trabalho... hoje temos a internet e qualquer um pode tentar divulgar seu trabalho e ter até que bons resultados...Quais os males e benefícios da internet na divulgação do compositor?

Você deveria recuperar este Tape e colocar no Ar.
Acho bem legal estes meios, mas acho que ainda estamos divulgando somente para nós mesmos. Pois a grande massa não ouve música na internet. Eles ainda ouvem na Rádio, Tv ou Som. Claro que fenômenos existem nesta área, eu mesmo uso estas ferramentas, mas não é tudo. Acho muito democrático saber que posso concorrer de igual pra igual com os Tubarões da industria.

Você acha que o Estado atrapalha ao patrocinar artistas? Por quê?

Acho exagerado o patrocínio do Estado. Acho que música popular tem que ser comercial. Muita gente pede apoio do estado para gravar disco e morre na praia. Não consegue vender os próprios discos. Tenho uma música no disco novo que fala disso. Por quê?
Deveria existir um controle maior destes patrocínios. Os meus discos eu gravei até hoje, somente com grana própria, advinda de shows e venda de discos.È muito fácil dizer que música não dá dinheiro. Por isso o Estado deve patrocinar. Eu sou a favor do caminho do meio. Tem que haver um certo equilíbrio.

A artista deve ir onde o povo está ou você concorda com a frase de Spinoza que dizia que a paixão do povo não o comove?

O artista deve fazer o que lhe der na "telha". Não penso nos outros quando estou fazendo música. Penso em idéias. E se estas idéias atingirem alguém fico feliz.
Mais uma vez acho que o caminho do meio é a resposta para esta pergunta.


Para conhecer O trabalho de Carlos Careqa é só acessar:



www.carloscareqa.com.br
www.myspace.com/carloscareqa

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